Fernando Piçarra, "A realização muitas vezes está no caminho e não no objetivo final."







Fernando Piçarra, nascido em 1966, tem 53 anos, é Road manager de uma banda portuguesa, chamada The Black Mamba, que interpreta vários estilos de música, incluindo jazz. Porém, é também fotógrafo numa empresa chamada Pictours Portugal.



Sofia: De que forma caraterizas a palavra “música”?

Fernando: Para mim, a música é um conjunto de silêncios e sons, consonantes preferencialmente, que nos tocam a alma.

Sofia: De que maneira a música começou a fazer parte da tua vida?

Fernando: Basicamente, desde que me lembro de mim, que a música sempre esteve presente na minha vida.

Sofia: Houve alguma pessoa que influenciou a tua carreira?

Fernando: Sim, muita gente, seria impossível enumerar todos. A partir de um determinado momento começamos a fazer o nosso próprio caminho e adaptar o que de bom vimos nos outros ao nosso quotidiano e processo profissional.

Sofia: Como surgiu a oportunidade de trabalhar com os The Black Mamba?

Fernando: Eu conheço o Pedro Tatanka há muitos anos, tinha ele uns 17 ou 18 anos, tínhamos aulas de guitarra com o mesmo professor, o nosso amigo Júlio Vilela. A dado momento o Tatanka perguntou-me se eu estaria interessado em trabalhar com eles e foi assim que tudo começou.

Sofia: Podes descrever como é trabalhar com a banda?

Fernando: The Black Mamba é uma banda que no seu conjunto, como grupo de trabalho, tem 17 pessoas na estrada. É necessário ter uma organização que possa responder ao sem fim de desafios do dia a dia e que uma tourne obriga a ter em atenção. Essa é a minha principal preocupação, naturalmente, o que me compete garantir, é que todos se possam sentir confortáveis na sua função dentro do grupo de trabalho, para que desempenhem também a sua função o melhor possível. Não falo só dos músicos, mas de todos os outros que não se vêm em palco, mas estão lá, para que o espetáculo possa existir. Trabalhar com esta banda é sempre desafiante, divertido, mas também exigente, todos estão aqui com uma certa paixão o que torna tudo mais fácil.




Sofia: Para um bom trabalho em equipa, o que achas essencial?

Fernando: Que todos percebam muito bem qual é a sua tarefa dentro do grupo de trabalho e que a cumpram com rigor.

Sofia: Como caraterizas o trabalho de um road manager?

Fernando: É um trabalho multifacetado, com necessidade de estar muito atento a todos os detalhes, garantir que tudo corre bem, o que nem sempre é fácil em função das infindáveis variáveis que a cada dia, a cada momento, a cado concerto é necessário ter. Como por exemplo, tens que garantir coisas como a alimentação, alojamento, transportes até aos detalhes técnicos das várias equipas que tens em palco, à necessidade pessoal de cada músico, a comunicação com imprensa à organização da agenda da banda, apoiar a banda no contacto com os fãs, relação próxima com os promotores, etc.

Sofia: Na qualidade road manager, o que mais gostas na tua profissão? E o que menos gostas?

Fernando: Vou começar pelo que não gosto… Não gosto de atrasos, de imprevistos (e estão sempre a acontecer), não gosto de desorganização, não gosto que não me respondam a mail’s ou telefonemas em tempo útil, não gosto de pessoas mal formadas… Gosto de ter a banda em palco, gosto de os ouvir ainda que seja pela milésima vez, gosto das pessoas que fazem parte deste fantástico grupo de trabalho que, me enchem de orgulho a cada concerto, não estou só a falar dos músicos mas de todo o grupo. Gosto de chegar ao fim de um concerto e perceber que tudo correu bem, que todos estão contentes com o desempenho da banda, não só o público, mas também a própria banda, gostos de ouvir elogios à banda, o que felizmente acontece muito, gosto de andar na estrada.

Sofia: Sentes que as pessoas reconhecem o trabalho que realizas por detrás dos artistas?

Fernando: Quem está na indústria sabe e reconhece, o grande público não tem ideia do trabalho que está por detrás de uma banda ou até de um simples concerto. Na realidade só existe esta função porque existem artistas, esses é que devem ser reconhecidos porque são eles o motor da indústria.

Sofia: Qual foi a melhor coisa que já te disseram em toda a tua carreira?

Fernando: “Bom trabalho!”

Sofia: Enquanto, road manager, como é assegurar a vida pessoal uma vez que passas a maior parte do tempo a viajar?

Fernando: Há sempre forma de articular as coisas, os meus filhos já são pessoas adultas com as suas carreiras o que facilita neste momento as ausências.

Sofia: Qual é o teu objetivo profissional, o que procuras para elevares a tua carreira? Ou sentes-te em pleno com tudo o que já alcançaste?

Fernando: Não, sinto que temos alcançado muito, fruto de um trabalho conjunto com um enorme esforço, até porque The Black Mamba não é propriamente uma banda “mainstream”. Modéstia à parte, sei que esta banda é muito maior do que o reconhecimento que o mercado lhe atribui. Como disse num post que fiz no Facebook, após os concertos dos coliseus de Lisboa e do Porto, The Black Mamba é uma flor no asfalto que teimou em sobreviver. Começa a não ser possível ignorar, mas falta ainda outro nível de reconhecimento que, por direito próprio a banda já merecia ter, tanto por parte do público, como dos media. Quando isto acontecer talvez me sinta mais realizado.

Sofia: Para além de seres um apaixonado pela música, também és pela fotografia, correto?

Fernando: Sim é verdade!

Sofia: De que maneira, descreves essa paixão?

Fernando: As paixões não se descrevem, fogem-nos à racionalidade, sempre gostei de imagens e das histórias que nos contam. Lembro-me de ser ainda muito pequenino e ter sempre muitas revistas estrangeiras em casa que o meu pai trazia (trabalhava na TAP), eu passava horas a ver aquelas imagens que me fascinavam. Comprei a minha primeira máquina fotográfica com o primeiro dinheiro que ganhei, depois fui sempre fazendo as minhas imagens. Graças a esta paixão, hoje dirijo uma atividade também ligada à fotografia que me dá um gozo imenso.

Sofia: Como é o teu trabalho na Pictours Portugal? De que forma apareceu esta oportunidade?

Fernando: A Pictours Portugal é algo que nasce da paixão pela fotografia, um dia estava a fotografar com uma grande amiga canadiana, hoje em dia minha sócia, a Marion McCristall, que aliás tinha vindo viver naquela altura para Portugal por se ter apaixonado pelo nosso país. Numa viagem fotográfica que tive o imenso gosto de fazer com ela, surgiu a ideia de fazer workshops e tours fotográficos dirigidos ao mercado exterior, e foi assim que apareceu a www.pictoursportugal.com







Sofia: De que forma, retratas todo o teu percurso profissional nas duas áreas?

Fernando: Há uma coisa comum aos dois projetos, enche-me a alma trabalhar com pessoas virtuosas, criativas e apaixonadas. Ter o privilégio de partilhar momentos com pessoas que criam e que o fazem bem é sem dúvida uma dádiva maior. Como se costuma dizer, “nunca trabalharás quando fazes o que gostas”.

Sofia: Achas que, com paixão, é possível dar o máximo em tudo aquilo que as pessoas gostam de fazer?

Fernando: Tenho a certeza, absoluta, que sim!

Sofia: Que conselho ofereces aquelas pessoas que querem ter como carreira profissional como tu?

Fernando: Atualmente, num mundo de trivialidades e paixões efémeras onde o mundo digitalizou a vida das pessoas tende a não ter objetivos a médio e longo prazo, à primeira contrariedade desistem dos projetos, das pessoas, das paixões. Não é possível construir sem dedicação, sem algum sacrifício, planeamento, foco, perseverança e honestidade. A realização muitas vezes está no caminho e não no objetivo final. O conselho é, acreditarem em si mesmas, procurem fazer alguma coisa de que gostem. Devemos desfrutar do presente também, e não unicamente da obstinação de um futuro que muitas vezes nos escapa ou tarda a chegar e que, pode constituir uma frustração. Se tivermos sempre presente estes princípios, consequentemente a carreira aparece.


Em Londres 2017, Fernando Piçarra, Pedro Tatanka, Skyler Jett (Vocalista dos Comodores após Lionel Richie, ex membro da banda Sly and Family Stone, vencedor de um Grammy pelos arranjos na música de Celin Dion My Heart Will Go On, tema do filme Titanic) que colaborou com The Black Mamba em vários trabalhos.

ULondres, Under the Bridge Club com Esther Anderson, actriz, realizadora, fundadora da Island Records com Chris Blackwell, foi namorada de Bob Marley, Mulher de Marlon Brando entre 1968 e 1975

Sofia Coelho (eu) e o Fernando Piçarra no concerto The Black Mamba, no Coliseu do Porto

Espero que tenham gostado desta nova entrevista, aqui no blog, mais virão!
Também podem encontrar esta entrevista na ULP Infomedia http://ulpinfomedia.pt/2019/11/05/fernando-picarra-a-realizacao-muitas-vezes-esta-no-caminho-e-nao-no-objetivo-final/


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